segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Olhos (e mentes) enganam

Falta de confiabilidade das testemunhas lança dúvidas sobre pena de morte

Três membros da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos contataram o Georgia State Parole Board no dia 20 de setembro em uma tentativa fútil de reabrir uma audiência de clemência para Troy Davis, que foi executado na noite de 21 de setembro pelo assassinato de um policial da Geórgia. Na sua carta, que apontou que a audição foi concluída sem que se tivesse a chance de ouvir Jennifer Dysart, psicóloga do John Jay College of Criminal Justice, em Nova York, especialista em testemunho ocular.

A ética de manter a pena de morte é uma decisão tomada pelos governos estaduais e pelos tribunais, mas cientistas como Dysart têm mais a dizer sobre a precisão de quem testemunha os crimes que produzem sentenças de morte. Os tribunais deveriam ouvir com atenção antes de tomar suas decisões, por causa da aparente falta de confiabilidade.

O Innocence Project, uma organização de processos e políticas públicas afiliadas à Escola de Direito Benjamin N. Cardozo, da Yeshiva University, em Nova York, descobriu que a identificação por testemunhas oculares tem desempenhado um papel importante em três quartos dos 273 casos de condenação errada que depois são exonerados por prova de DNA nos Estados Unidos. No caso de Davis, várias das testemunhas retrataram seus testemunhos antes de sua execução.

Cientistas sociais também têm criticado a validade dos procedimentos utilizados na identificação de suspeitos. Em 19 de setembro, mesmo dia em que o conselho de liberdade condicional realizou a sua audiência de clemência, um estudo realizado por Dysart e seus colegas revelou que as testemunhas tornariam mais precisa a identificação dos suspeitos pela formação de um sequencial em que cada membro individual seria visto separadamente e o oficial da lei não soubesse quem é o suspeito. O que acontece na maioria dos casos, incluindo o caso Davis, faz lembrar dos episódios de Law and Order, em que todos os membros estão lado a lado e o policial sabe quem é o suspeito. No estudo, Dysart descobriu que quase 42% das testemunhas cometeram erros nesse formato tradicional, em comparação com 31% em um formato sequencial.

Em um depoimento preparado para o conselho de liberdade condicional, Dysart apontou que após a prisão de Davis, em 1989 (ver pdf com o depoimento, o estudo Dysart e uma carta do Innocence Project), os investigadores fizeram uma reconstituição do crime com as testemunhas oculares e usaram "técnicas de identificação sugestivas". Em 2008 , a Georgia Standards Peace Officer adotou um programa de treinamento de identificação das testemunhas oculares e não apoia mais essas práticas, que, segundo Dysart, contribuíram para a identificação errada de Davis. A psicóloga planejava encerrar seu depoimento, dizendo: "...devido a problemas significativos com o testemunho ocular neste caso, há um perigo substancial de que várias testemunhas tenham prestado identificações com falhas. Como resultado, o Conselho deve dar pouco peso para as testemunhas oculares apresentadas pelo Estado".

É tarde demais para Davis, mas talvez não para outros. Em junho, o Supremo Tribunal de Nova Jersey emitiu novas regras para determinar a confiabilidade das testemunhas antes de apresentar o testemunho de jurados. E o Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos aceitou um caso que diz respeito à identificação de testemunhas. Pouco a pouco, o acúmulo de descobertas científicas pode ajudar a garantir que os inocentes não sejam injustamente acusados.

Fonte: Scientific American

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